Retina Desgastada
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21 de março de 2024

Jogando: Outcast - A New Beginning

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(publicado originalmente no Gamerview)

Minha história com a franquia Outcast se confunde com minha própria história como "gamer", essa entidade abstrata que busca aventuras virtuais. Excetuando um curto período da infância, em que me divertia com meu Dynavision (clone do Atari, para quem não viveu isso), minha trajetória começou mesmo em 1998, com meu primeiro PC. Em 1999, estava testando a demo do primeiro Outcast. Dali para frente, foram duas décadas tentando decifrar aquele jogo.

A história da obra prima da Appeal está muito bem documentada. É a história de um jogo ambicioso prejudicado por bugs. Foi lançado com problemas. Em 2010, ressurgiu com várias correções, mas ainda problemático. Ganhou uma versão HD em 2014, ainda com problemas. Ganhou um remake em 2017, com novos problemas. Tentei todos. Minha relação com o mundo de Adelpha beirava a obsessão. De frustração em frustração, terminei a aventura original de Cutter Slade somente em 2021. Foi uma vitória e uma jornada inesquecível.

Retorno para o ponto de partida com Outcast – A New Beginning, um quarto de século depois. Os desenvolvedores originais amadureceram, o jogo amadureceu, seu universo amadureceu e eu também. Entretanto, tão logo subiu a música tema, eu sabia que tinha voltado para um lugar muito querido. Desta vez, sem problemas técnicos que possam ser considerados graves.

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Atrasado no Rolê

Se meu preâmbulo foi longo, foi tão somente para deixar claro que minha análise será tudo, menos objetiva. Eu conheço esse povo, eu conheço essas lendas, eu conheço essas mecânicas e amo todos. Encarnar novamente o Ulukai, o grande salvador de Adelpha, não é uma obrigação, mas um prazer. Parece que foi ontem que disse "adeus", achando que nunca ia mais ia voltar.

O que pode gerar o questionamento: Outcast – A New Beginning é amigável para quem nunca jogou o título anterior? Eu diria que não poderia ser mais amigável. O primeiro fator é que os veteranos da Appeal fizeram jus ao seu nome e "apelaram" para um recurso narrativo muito manjado: o protagonista perdeu suas memórias. Cutter Slade não lembra de praticamente nada de sua primeira jornada e nem dos motivos que o fizeram se materializar novamente nessa outra dimensão. Então, o jogador terá a oportunidade de entender com ele como funciona a sociedade dos Talans, seus costumes, sua mitologia e até seu vocabulário.

Desta forma, o glossário, que antes ficava escondido na interface original, agora está a um botão em qualquer diálogo. Tudo é muito bem mastigadinho para os iniciantes ou para aqueles veteranos que desfrutaram de tudo muitos anos atrás. Entretanto, esses últimos serão beneficiados com alguns easter eggs de aquecer o coração (visite o Museu do Ulukai, em Prokriana para uma farta dose de nostalgia).

O mundo de Adelpha desta vez está sendo invadido por uma força tecnologicamente muito superior: a raça humana. Slade terá que se voltar contra seu próprio povo e destruir máquinas assassinas para libertar os Talans do colonialismo. Ao mesmo tempo, será necessário decifrar as lacunas de memória em sua mente e descobrir os erros que ele cometeu entre um jogo e outro, assim como os motivos que o trouxeram de volta para Adelpha. Nesse ponto, Outcast – A New Beginning traz uma história mais emocional e intimista que o jogo original, porém sem perder o foco de suas maiores forças: exploração e senso de encantamento.

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O Mundão de Outcast

Vinte e cinco anos depois, é fácil tentar enquadrar Outcast – A New Beginning como um simulacro de Assassin’s Creed ou Far Cry. Há um mapa de mundo aberto, há missões marcadas nele, há bases inimigas para serem tomadas. Também é possível estabelecer paralelos com os últimos Zelda, com templos para serem descobertos, desafios de plataforma para serem vencidos em troca de novas habilidades. Entretanto, justiça seja feita: é importante ressaltar que tudo isso já estava lá em 1999. O novo Outcast moderniza o que antes foi pioneirismo da Appeal.

Enquanto isso, a desenvolvedora volta a apresenta paisagens deslumbrantes de cair o queixo, conseguindo entregar o que antes foi impossível: Adelpha agora pode ser explorada de forma contínua. Antigamente, apenas portais de teleporte ligavam as regiões. Na sequência, é possível cruzar o continente a pé, com raras exceções.

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Outcast – A New Beginning infelizmente não é tão vasto quanto seus concorrentes atuais, mas a Appeal compensa isso com um senso de mobilidade único e verticalidade. A nova mochila a jato é muito mais presente do que antes, permitindo saltos monumentais, planagens de tirar o fôlego ou pura e simplesmente locomoção horizontal sem colocar os pés no chão. É raro um jogo em que o próprio processo de ir de um lugar para o outro seja tão agradável.

Da mesma forma, Adelpha acaba se tornando mais denso que muitos open world por aí, com personagens exóticos por toda parte e missões inusitadas dentro da campanha principal. É uma pena que as missões secundárias sejam repetitivas, mas ninguém é obrigado a fazê-las. Ainda assim, esse mundo pulsa com dramas e situações que alteram a paisagem das vilas e seus arredores. É possível passar uma ou duas horas sem perceber o tempo voando, uma viagem surreal para outra cultura.

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Facilitou Demais?

Não seria um jogo da franquia Outcast se fosse totalmente isento de problemas de natureza técnica. E que jogo é, hoje em dia? Porém, as falhas são pequenas no título. A performance pode e será melhorada no lançamento, mas, jogando aqui com DLSS no balanceado, a queda de quadros foi ínfima. Para minha surpresa, não houve qualquer travamento ou comportamento bizarro de NPCs (como acontecia no remake do original). O bug mais estranho foram dois inimigos, em ocasiões distintas, que estavam dentro da terra, só o topo da cabeça pra fora (o que, na verdade, favoreceu o headshot).

A grande falha que afasta Outcast – A New Beginning da nota máxima, pelo menos, na minha opinião de "veterano" da franquia, é a simplicidade dos desafios. Longas foram as horas em que rodei pelo título anterior apenas tentando descobrir o que precisava ser feito para avançar a história. Aqui, cada missão é dividida em partes bem documentadas e há sinalizadores indicando as direções.

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Ainda é necessária uma boa dose de interação com os Talans, para resolver seus problemas, mas é tudo muito conduzido, talvez conduzido demais. Os próprios puzzles são mais simples e os combates seguem a linha do Remake, com pouca dificuldade. Ulukai podia liberar Adelpha (de novo) na base da bala, se o roteiro permitisse.

Porém, essa "desvantagem" pode ser o segundo grande chamariz para uma nova geração de jogadores. Todas as arestas do jogo original foram aparadas, todas as mecânicas estranhas foram simplificadas, todo o processo de adivinhação e até as constantes idas e vindas foram removidos. Sem esse atrito, Outcast – A New Beginning convida para um passeio por Adelpha, uma viagem inesquecível (e tranquila?) para quem tem sangue novo ou para os andarilhos de pés cansados.

Post- Mortem: Escrevi uma postagem inteira dedicada ao final do jogo. Haverá spoilers.

Ouvindo: Jack Wall - The Lazarus Project

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Blog criado e mantido por C. Aquino

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