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18 de maio de 2022

Jogando: King Arthur: Knight’s Tale

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(publicado originalmente no Gamerview)

Era uma vez um Rei que carregava uma espada portentosa e ousou reunir um seleto grupo de cavaleiros honrados para salvar a Britânia. Essa não é a história dele. King Arthur: Knight’s Tale é sobre como os sonhos de Arthur se transformaram em um pesadelo amargo após uma brutal batalha contra seu filho Mordred. As terras sagradas agora estão assolados pelos mortos e não há mais honra no horizonte.

A desenvolvedora NeocoreGames nos coloca no comando justamente de Mordred, o maldito. Cabe a nós reunir um novo time de defensores para tentar corrigir a decadência que paira sobre Avalon, misturando a jogabilidade tática por turnos de um XCOM com o gerenciamento de base e o clima funesto de um Darkest Dungeon. O resultado impressiona, envolve e escapa das brumas como um forte candidato a melhor RPG do ano.

As Brumas de Avalon

A épica cena de abertura do jogo não deixa dúvidas: não estamos lidando com uma versão da Disney da lenda do Rei Arthur. Com criaturas sobrenaturais grotescas, bruxas na linha de frente, legiões de mortos-vivos e muita feitiçaria, King Arthur: Knight’s Tale é a versão mais macabra possível para o mito, abraçando a fantasia de vez.

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Como rezam as histórias, Mordred feriu mortalmente Arthur Pendragon, antes de tombar por sua lâmina. Daí pra frente, a NeocoreGames subverte tudo e nos coloca Mordred como o herói que irá salvar a todos da fúria de um Rei Arthur ressuscitado e corrompido pelas trevas.

A Dama do Lago, que zela pelo bem-estar dessas terras, traz Mordred de volta de seu sepulcro. Mordred não é o mais forte, nem o mais resistente dos cavaleiros, mas domina um pouco da arte mística e tem o gene da liderança em seu sangue. Na armadura de Mordred, iremos recrutar os antigos cavaleiros da Távola Redonda, assim como novos e estranhos aliados, para uma cruzada para elucidar o mistério do Mal que se abateu sobre o mundo.

Apesar de Mordred ter se tornado uma força a serviço de um bem maior, King Arthur: Knight’s Tale não nos obriga a caminhar na direção desses ou daqueles valores morais. O jogador pode trilhar seu próprio destino, sendo cruel e implacável, como Mordred foi em vida, ou adotando uma postura mais pacificadora, buscando uma possível redenção.

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Além disso, é possível escolher privilegiar as religiões antigas e pagãs da Britânia ou adotar as crenças cristãs como Arthur fazia. Dentro do jogo, uma espécie de mapa ideológico irá nos mostrar o resultado dessas tendências, que podem trazer vantagens e desvantagens, assim como desbloquear aliados e situações específicas.

Administrar esse valores é peça fundamental do quebra-cabeças que é King Arthur: Knight’s Tale. Seus aliados lutam melhor quanto mais leais eles são a Mordred e essa lealdade pode ser comprada com títulos de honra ou perdida com posturas incorretas.

A impressão que tive é que tentar equilibrar os elementos é a pior abordagem possível. A neutralidade não é premiada e tender para o extremismo em qualquer direção pode trazer frutos melhores e mais interessantes à medida em que a aventura progride. Porém, optei por misturar ideologias e ações e não encontrei obstáculos em meu avanço.

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A Espada Era a Lei em King Arthur: Knight’s Tale

As semelhanças com Darkest Dungeon não estão apenas no tom opressor das aventuras. No jogo, temos o controle de Camelot, que será nossa base de operações. Ali, é possível construir e administrar estruturas que irão curar aliados feridos, negociar equipamento, aprimorar magias e habilidades de combate, assim como também enterrar os cavaleiros tombados na cripta, uma vez que a morte também é irreversível aqui. A partir de Camelot, a cada rodada, King Arthur: Knight’s Tale libera novas missões que podem ser resolvidas na ordem que o jogador quiser.

Entretanto, o paralelo com Darkest Dungeon termina na hora da exploração em mapas 3D e perde toda e qualquer razão de ser no momento em que o combate se inicia. King Arthur: Knight’s Tale traz batalhas por turno com pontos de ação para cada herói em um diagrama dividido em quadrados.

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É importante prestar atenção no uso inteligente dos pontos de ação, assim como nas habilidades dos inimigos. A maioria dos aliados tem pontos de armadura que amenizam os golpes recebidos, mas que também se gastam. Os danos produzidos afetam os pontos de vida. Tanto pontos de armadura quanto pontos de vida podem ser curados com poções ou descanso em fogueiras. Porém, uma vez que os pontos de vida se esgotam, os danos seguintes afetarão a vitalidade e essa não se regenera, a não ser no hospital, de volta em Camelot.

Então, temos diferentes classes de heróis em King Arthur: Knight’s Tale: tanques blindados que suportam uma quantidade absurda de ataques sem correr risco de vida, mas que são lentos; arqueiros e bruxos que acertam oponentes de longe, mas tem baixa resistência; e aqueles, como o próprio Mordred, que são um meio termo de agilidade, versatilidade e resistência.

O combate embora seja delicioso inicialmente, logo se torna repetitivo por oferecer poucas variações táticas. Há variáveis demais em andamento que na verdade provocam pouco impacto. A maioria dos inimigos será morto por uma boa espadada, antes dos efeitos de veneno, fogo ou sangramento cobrarem seu preço, por exemplo.

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O bom posicionamento é muito mais importante para decidir uma luta, assim como a atenção extrema, uma vez que King Arthur: Knight’s Tale não permite que o jogador mude de ideia durante seus movimentos ou ataques. Clicou, já era.

O Retorno do Rei

Na narrativa, há um fio condutor mais nítido do que existe em Darkest Dungeon. Ainda assim, a história da NeocoreGames anda devagar. A necessidade de se fazer missões secundárias antes de se progredir nas missões de enredo apenas amplia a sensação de se estar preso nas brumas de um sonho.

Esse clima onírico talvez seja proposital, já que todos os mapas de Avalon apresentam pouco contraste. O sol nunca brilha, às vezes é difícil distinguir onde existe uma rota e onde não é possível passar.

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A atmosfera de Idade das Trevas é realçada por uma trilha sonora que só pode ser descrita como soturna, com momentos gloriosos. Não há muitos motivos para se celebrar as vitórias: estamos em King Arthur: Knight’s Tale apenas tentando dar um destino melhor para uma utopia que naufragou, recolhendo os pedaços de honra e lealdade que sobraram depois dos erros cometidos por Mordred.

Tematicamente, a NeocoreGames acertou em cheio. Há melancolia, há mistério, há superstição para todos o lados nessa recriação do ciclo arturiano. É apenas um sistema de combate um pouco aquém do seu potencial que impede esse jogo de atingir uma nota ainda maior.

Ouvindo: Nirvana - Drain You

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