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2 de fevereiro de 2022

Jogando: Ghostbusters The Video Game

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Tirei o último mês para reacender meu gosto pelo universo dos Caça-Fantasmas, uma das franquias preferidas da minha infância (que o segundo filme quase destruiu). Revi o primeiro longa-metragem, com seus efeitos especiais envelhecidos e seu humor anacrônico e assisti o terceiro filme, o fortemente sentimental Caça-Fantasmas: Mais Além. Para completar o circuito, era evidente que faltava uma peça na coleção: o elogiado Ghostbusters The Video Game.

Para entender a devoção que os fãs nutrem por esse derivado, um entre tantos outros jogos eletrônicos ambientados no mesmo universo, é preciso entender seu processo de gestação. Durante um longo período, Harold Ramis e Dan Aykroyd, respectivamente os personagens Ray e Egon, mas também os roteiristas e produtores da franquia, tentaram emplacar um terceiro longa metragem nos cinemas, sem sucesso. Ou os estúdios não tinham interesse, ou a trama não era boa o suficiente ou o dublê de ator e estrelinha Bill Murray (o impagável Peter Venkmann) se recusava a retornar.

Uma dessas tentativas fracassadas de fazer um novo filme culminou em uma reviravolta: fazer um jogo. Portanto, para todos os fins, Ghostbusters The Video Game é o terceiro filme que nunca foi feito com o grupo completo. Todos os atores que fazem os Caça-Fantasmas (mais a atriz que interpretava a secretária Janine e mais outros coadjuvantes) voltaram para dublar suas representações dentro do jogo. Novamente, Harold Ramis e Dan Aykroyd assumiram o roteiro. O resultado é um jogo com forte foco na história e nos hilários diálogos entre seus personagens, que traz uma sensação gostosa de realmente não apenas estar vendo um filme inédito, mas também participando dele.

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Em Ghostbusters The Video Game, controlamos Rookie ("Novato"), uma espécie de quinto Caça-Fantasmas que acaba de ser contratado. Funcionamos como um estagiário e tudo indica que houve outros antes de nós que não tiveram muita sorte. É a sacada perfeita para que nós não roubemos a cena dos personagens principais e ao mesmo tempo sejamos soltos como um fã de carteirinha nas ambientações da franquia. É evidente que o título foi desenvolvido como uma espécie de tributo ao seu universo. Não é por acaso que revisitamos o Hotel Sedgewick e a Biblioteca (com a fantasma que nos pede silêncio), assim como acontece uma revanche contra Gozer em sua forma de gigante de marshmallow. O jogo nos convida à nostalgia, nos permite explorar o quartel-general do grupo e mexer em seus brinquedos. Talvez o único defeito nesse aspecto seja não ter uma sequência em que o Ecto-1 possa ser pilotado por nós.

Essa abordagem suprime bastante a personalidade do Rookie. Ele não tem qualquer fala ao longo de toda a trama (ainda que seja constantemente foco de piadas e pegadinhas dos veteranos, mas também elogios). Apesar de ser expressivo, nas poucas cenas em que seu rosto é mostrado, o fato inegável é que o Rookie é apenas um avatar para á câmera e um par de braços que segura nossas armas.

O ponto central da experiência segue sendo as interações entre os Caça-Fantasmas originais, com um timing perfeito para humor. Apesar de não vermos os atores atuando, é perceptível que a dublagem foi realizada com esmero e prazer de estar reunido. Para quem não domina o idioma inglês, o volume de diálogos, mesmo com legendas, pode ser um pouco excessivo, principalmente nos tensos momentos de combate, mas perder as conversas seria perder a maior parte do charme de qualquer bom produto da franquia.

Felizmente, Ghostbusters The Video Game não se apoia somente no saudosismo. Na hora em que ele precisa ser um jogo (e, não se engane, ele é um jogo de verdade, com várias partes bastante desafiadoras), ele inova e acrescenta ao universo. Somos apresentados a novas armas e tiros alternativos que fazem a diferença contra as criaturas. O Sensor PKE, que aparece mais como um objeto cosmético nos filmes, aqui é fundamental para resolver puzzles e identificar as assombrações e, principalmente suas fraquezas. Há inimigos que são extremamente difíceis de se vencer com a arma errada, mas bem tranquilos com o equipamento correto.

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Da mesma forma, o Sensor PKE abre o jogo para uma mecânica de colecionável muito divertida. Em termos gerais, não tenho paciência para juntar itens, explorar cantinhos em busca de segredos. Na maioria das vezes, são objetos repetitivos sem qualquer valor além de apenas encontrá-los. Em Ghostbusters The Video Game, os colecionáveis são artefatos amaldiçoados curiosos, cada um deles com uma pequena história que expande o mundo sobrenatural. Em que jogo você encontraria uma barba possuída por um demônio que vaga pelos séculos ou uma almofada maldita que se diverte liberando ruídos constrangedores contra quem nela senta? Encontrar novos artefatos se tornou um prazer, a certeza de descobrir uma nova historieta bizarra que só enriquece a experiência, mesmo que não tenha qualquer efeito mecânico ou mesmo conquista.

Por muito pouco, quase desisti do jogo. Alguns comandos são obtusos (Espaço para correr?) e diversas batalhas exigem uma combinação de sorte e perícia. Além disso, não joguei a versão remasterizada, mas sim a versão original do jogo, que ainda guarda alguns bugs que me obrigaram a recarregar pelo menos dois checkpoints. A batalha final é tão lotada de partículas voando e escombros que conseguiu provocar queda de frame em minha placa moderna. Uma GTX 1650 de 4GB está longe de ser topo de linha, mas está anos-luz à frente do que havia em 2009, quando o jogo foi lançado. Desativar as partículas me permitiu concluir a batalha sem problemas.

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Fui surpreendido também com o aspecto mais macabro do universo dos Caça-Fantasmas. Em diversas partes, o jogo consegue provocar calafrios, com cenários perturbadores ou situações grotescas. O humor nos diálogos e a certeza de estar carregando um acelerador de prótons nas costas me deram a confiança de superar esses momentos, atingindo um equilíbrio perfeito entre comédia e terror de que poucas obras são capazes.

O futuro da franquia é incerto. Houve duas tentativas de se passar o bastão, com resultados diversos. Ainda que eu tenha curtido a reinvenção do filme de 2016, ele está bem distante de ser uma unanimidade, para ser gentil. A obra mais recente é referencial e reverencial demais para seu próprio bem, mas as portas estão abertas para o mundo dos espíritos. Para mim, resta agora torcer por novas e melhores produções, inclusive nos jogos eletrônicos. Afinal de contas, quando os espíritos atacarem, quem você irá chamar?

Ouvindo: REM - Harborcoat

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