Retina Desgastada
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24 de junho de 2017

Jogando: Far Cry 2

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Vagando pelo matagal tórrido de um país não nomeado na África, com a luz do Sol lutando para penetrar na densa vegetação, com água parada batendo no joelho, andando agachado para não chamar a atenção, em seus minutos finais, com os nervos à flor da pele, eu imaginei como Far Cry 2 seria o cenário perfeito para um Predador.

Até me dar conta que o Predador era eu.

Sem utilizar caçadores alienígenas, criaturas mutantes (como o primeiro Far Cry), cientistas loucos ou super soldados, o segundo título da franquia que não é franquia consegue ser mais horrendo e perturbador que muitas obras que usam o fantástico como metáfora. Nesse coração das trevas, a vida humana é uma piada, a amizade é uma piada, a razão e a sanidade são piadas.

Ainda me questiono o quanto de talento a Ubisoft colocou no jogo ou se tudo aquilo que testemunhei nada mais é que uma tentativa de enxergar um padrão onde habita somente o caos. Seus desenvolvedores sabiam o que estavam produzindo ou apenas seguiam uma agenda e, por obra do acaso, ou somente através do meu olhar, emerge uma obra quase prima?

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O motor gráfico gera uma vastidão africana que pulsa vida, há selva, há savana, há paisagens de cair o queixo, vida selvagem que foge dos descalabros do homem, um mundo aberto que será cruzado no fogo da bala ou com o pé no acelerador. Entretanto, apesar de tanta poesia, do supostamente importante elemento humano, a Ubisoft injetou aqui a mais repetitiva das jogabilidades: vá até o local X, mate A ou destrua B, retorne, pegue outra missão. São dezenas de horas assim, com pouquíssimas variações, com todos os oponentes iguais, igualmente querendo te matar. Mesmo sem fazer quase nenhuma missão secundária, eu estava exausto.

A menos que você preste muita atenção, a história desse conflito passa batida. Você é um mercenário, chegou na região para localizar e matar o elusivo vendedor de armas conhecido como Jackal, que está comercializando seu produto para os dois lados da guerra civil, impedindo a paz e lucrando com isso. Em uma coreografada cena de abertura você descobre que essa é uma guerra sórdida e que você não sairá desse país incólume.

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Parece que o jogo virou, né?

Entre idas e vindas da trama, há a clara sensação de que a Ubisoft não se importa com o roteiro. Tudo aparenta ser uma desculpa para empurrar você para as missões mais sem sentido possíveis. Os diamantes se acumulam em sua conta, um amplo cardápio de armas lhe é oferecido, os corpos tombam de formas espetaculares.

O Último Rei da Escócia

Exceto que, talvez, exista uma possibilidade que a Ubisoft sabia o que estava fazendo. Uma dúvida que já estava latejando no fundo da minha mente, como uma doença que vem e vai, como a malária que assola o personagem principal, se solidificou como um murro no estômago.

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Você cumpre missões para os dois lados. Os dois lados odeiam você. Você é perseguido por todos, mesmo o sistema de amizades estabelecido dentro do jogo é uma piada no final de tudo. Depois de horas e horas de missões repetitivas, você está anestesiado para tudo isso, para o Jackal, para o conflito, para os corpos que se acumulam...

... e nem mesmo os diamantes mais importavam para mim, gastei uma fortuna pelo ato de gastar, em armas que não testaria, para consertar veículos mais rapidamente, para aparentemente melhorar a acurácia de armas que já me pareciam perfeitas. Eu não estava me importando mais. E talvez, talvez, esse fosse o plano o tempo todo.

Sem me dar conta, após trinta e tantas horas naquele Inferno brutal, eu era o Predador. Eu era a guerra. Eu era o monstro que a trama dizia que eu tinha que caçar.

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E talvez seja somente uma história mal-contada, um emaranhado de tiroteios banais inspirados por conflitos que acontecem agora mesmo e com os quais ninguém parece se importar.

Saio de Far Cry 2 atormentado por muitas dúvidas, se vislumbrei a genialidade ou desperdicei meu tempo com a mediocridade de mais um FPS. Quem era o Jackal?

Ouvindo: Godsmack - What If

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