Retina Desgastada
Idéias, opiniões e murmúrios sobre os jogos eletrônicos
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10 de setembro de 2016

"Audaciosamente..."

Em 9 de Setembro de 1966, a televisão norte-americana exibia pela primeira vez uma série de TV que deixaria sua marca pelas cinco décadas seguintes e deixaria seu nome escrito na ficção-científica: Star Trek, ou, como qualquer brasileiro que cresceu nos anos 80 aprendeu a chamar, Jornada nas Estrelas.

Eu fui um desses moleques, que, até onde minha memória vai, teve seu primeiro contato pra valer com o gênero através das aventuras do Senhor Spock, Capitão Kirk e Doutor McCoy. É possível que eu já conhecesse o trabalho de Júlio Verne a essa altura de minha vida, mas é preciso lembrar que o escritor francês anteviu a nossa época. A obra de Gene Roddenberry anteviu o futuro.

Ira de Khan

Assisti as infinitas reprises na televisão, e o primeiro longa-metragem de cinema certamente também foi o primeiro longa de ficção-científica que vi nos cinemas. E lembro claramente de contar as horas para a exibição do episódio da série que servia de prelúdio para A Ira de Khan, e brigando com meu pai defendendo que era o filme completo e iria passar na TV. Não era, mas quase imediatamente depois tive a oportunidade de ver a batalha impressionante entre Khan e Kirk na tela grande, um filme que serviu para forjar o termo "épico" em minha mente em desenvolvimento.

Meu entusiasmo com a série esfriou com o tempo, talvez sublimado por outros interesses ou porque há um limite para quantas vezes um jovem pode ver as mesmas reprises de novo e de novo. Praticamente pulei a A Nova Geração, um pecado que pretendo corrigir sabe-se lá quando. No cinema, os filmes claramente caíam de qualidade. Muitos, vi apenas uma vez, para nunca mais rever.

Deep Space Nine reacendeu por um momento meu olhar, mas não o suficiente para ver Voyager e, muito menos, Enterprise.

O que me leva a perguntar: o que me fez jogar Star Trek: Voyager - Elite Force?

Elite Force

Kobayashi Maru

Voyager nunca foi a mais popular das séries da franquia espacial, nem mesmo entre os fãs mais devotados. Ação nunca foi a proposta central da criação de Roddenberry, apesar de ter momentos de tirar o fôlego. O motor gráfico idTech III havia acabado de estrear com Quake III Arena. Então, por que a Activision resolveu reunir todos esses elementos na forma de um FPS? E por que eu me interessei?

São perguntas para as quais não tenho respostas, mas fico feliz que esse cenário aparentemente destinado ao fracasso tenha se resolvido, muito em parte graças ao talento da Raven Software.

A história da Raven é algo sobre o qual já falei ao analisar Marvel Ultimate Alliance, mas cabe um rápido resumo: eles tinham talento. Não apenas em seus subestimados títulos desenvolvidos internamente, mas também com propriedades intelectuais que eram jogadas em seu colo. Onde outros estúdios certamente fariam produtos genéricos, confiantes apenas no peso das franquias a que pertenciam, a Raven se dedicava a entregar um produto que agradasse aos fãs e ao mesmo tempo funcionasse como um bom jogo mesmo sem aqueles elementos.

CoverCoube à Raven fazer o melhor jogo inspirado em Star Trek até hoje. E era um FPS. E era baseado em um time de personagens secundários do seriado menos popular da franquia. E utilizando um motor gráfico quase experimental. Mas eles triunfaram.

Muito antes da Telltale virar moda, a Raven coçou a cabeça e teve a brilhante ideia de dar ao seu jogo um clima de episódio da série. Todo o elenco original dublou seus personagens, a forma como a trama era apresentado tinha o ritmo de um programa de TV, inclusive na forma como os créditos eram apresentados. Houve esmero na trilha sonora e uma recriação bastante fidedigna e livre para exploração da espaçonave que dava nome à série.

Entretanto, nada disso teria funcionado se Elite Force não tivesse uma boa história e  não fosse um FPS competente. No primeiro quesito, tinha todos os ingredientes necessários: buscando inspiração nos grandes mistérios do espaço, o jogo colocava a Voyager aprisionada em uma anomalia cósmica onde diversas outras naves também estavam aprisionadas por toda a eternidade. Cabia ao jogador, ao time de elite da segurança da nave, entrar em contato com os outros náufragos, muitos hostis, para decifrar esse enigma e encontrar uma forma de sair desse cemitério cósmico. Apesar de ser um FPS, havia vários NPCs, momentos de tensão que não eram resolvidos com tiros e reviravoltas.

Invasão

The Borg

No aspecto do FPS, Elite Force não ousava. Mas também não decepcionava. Preferindo focar na atmosfera e na construção de um universo palpável ao invés de trazer tiroteios frenéticos e armas bombásticas, a Raven, acredito eu, tomou a decisão certa. Afinal, estamos falando da mesma empresa que anos depois faria um dos meus FPS preferidos: Quake IV.

Ainda assim, há elementos no jogo que não era comuns em FPS no ano de 2000, como conversações (inclusive algumas que podem alterar os eventos), aliados controlados pela AI e a possiblidade de se andar livremente por determinadas áreas.

Seu maior defeito talvez seja a curta duração. Novamente, acredito que a Raven optou por sacrificar esse fator em prol de manter a estrutura enxuta de um episódio de série, evitando as tradicionais lutas seguidas contra os mesmos inimigos tão usuais no gênero.

Ataque na Ponte

Infelizmente, Star Trek: Voyager - Elite Force é um daqueles jogos que dificilmente poderá ser vendido novamente. A produtora Activision tem uma tradicional prática de licenciar marcas por períodos limitados e jamais renová-las, tendo lançado inúmeros jogos baseados em heróis do Universo Marvel, por exemplo, que desaparecem do mercado depois de um tempo. Para agravar a situação, a Paramount Pictures e a CBS, detentoras dos direitos de Star Trek, também são muito rigorosas no uso da marca.

E, no final das contas, o jogo que não deveria ter existido, sobre uma tripulação perdida em uma espécie de limbo, cumpriu sua sina.

Ouvindo: The 69 Eyes - Mr. Pain

Um comentário:

Kátia disse...

Eu asisti muita Jornada Nas Estrilas, muito bom.

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