Em 3 de Julho deste ano se completaram dez anos de uma guerra. A última guerra da humanidade contra os mortos. Uma guerra silenciosa travada nos bastidores da web que já atraiu legiões incontáveis de zumbis e de caçadores para a amaldiçoada de Malton. Dez anos depois, ainda não há sinal de vitória para nenhum dos lados. A guerra continua.
Em 3 de Julho de 2005, um certo Kevan Davis lançou na Internet um jogo multiplayer de zumbis para navegador com uma interface mínima, sem artes, vídeos ou gráficos bonitos. Apenas quadrados. E morte. Era Urban Dead.
O jogo traz uma colossal grade de 100 quarteirões por 100 quarteirões com uma grande quantidade de bairros de Malton, a cidade lacrada em quarentena com uma infecção alarmante de mortos-vivos. Antecipando os títulos de survival que tomariam de assalto o Early Access do Steam, Urban Dead colocava você no centro deste apocalipse com o mínimo de equipamento, sendo obrigado a explorar diferentes tipos de prédios em busca de armas, medicação, ferramentas e um abrigo seguro para sobreviver ao contato com as criaturas.
Mesmo hoje, Ridleybank ainda é um local dominado pelos mortos
Todos os personagens eram controlados por jogadores e você tinha um número limitado de turnos de ação por dia. Você podia ser obrigado a descansar em um momento, apenas para retornar horas depois e descobrir que seu Policial, ou Bombeiro, ou Cientista, era agora um zumbi, depois de ter sido atacado até a morte por um dos infectados.
Era possível evoluir seus personagens comprando habilidades e diferentes mecânicas davam um ar de estratégia e complexidade ao título. Grupos se organizaram e nestes dez anos foram protagonistas de momentos épicos, como a Batalha de Caiger Mall que reuniu mais de mil participantes durante meses no cerco a um Shopping Center ou as hordas nômades de zumbis que espalhavam a destruição por onde passavam.
Descobri o Urban Dead através do Homepage of the Dead, um site dedicado à obra de George Romero especificamente e ao fenômeno cultural dos zumbis, de uma forma mais ampla. Criei ali Charlie Ramone, um policial cínico que prezava a própria sobrevivência acima de tudo. Também criei Lucy Dark, uma adolescente zumbi que evoluiu para se tornar uma das criaturas mais assustadoras do jogo, um dos raros morto-vivos de último nível. Logo depois, incomodado com o limite de ações por personagem, criei um terceiro: Mick Ramone, um bombeiro idealista capaz de arriscar a própria vida para salvar a de outros.
Com o tempo, cheguei a fazer uma doação para o jogo, para liberar o limite de ações por IP que o jogo impunha (para impedir o zerging, o ato de criar múltiplos personagens e usá-los como uma legião de ataque). Criei uma história para meu trio: eram todos irmãos, separados pelo apocalipse, cada um sobrevivendo à sua maneira. Com o tempo, o pobre Mick Ramone desistiu de ser um bom samaritano. Insisti muito em defender uma vizinhança que estava sob constante ataque dos zumbis. Na última transformação, decidi que Mick não seria mais curado e se transformaria em um brainrot, o tipo de criatura que é extremamente complicada de reverter para ser vivo outra vez.
Foram bons tempos, mas a própria natureza infinita da guerra me cansou. Meus personagens ainda existem no jogo. Acessei eles hoje. Mick Ramone estava caído, mas fiz ele se levantar. Meu trio se junta aos outros 5443 personagens considerados ativos. Mais de 60% destes são sobreviventes, contra uma minoria de zumbis. Trancados em suas fortalezas, pode-se dizer que estão seguros por enquanto.
Para um jogo que já chegou a ter mais de 2 milhões de jogadores registrados, é um final lento e doloroso.
Mas o site, assim como os zumbis, não dá sinal de que irá morrer.
A guerra continua.
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