- Aproxime-se, fazendeiro. Eu tenho uma missão para você!
- Pode falar, Sua Majestade!
- Nosso reino encontra-se ameaçado pela terrível Legião Sangrenta de Khala Khan. Apenas um milagre pode nos salvar da destruição!
- Chato isso, não?
- Nossos mais nobres cavaleiros e magos estão ocupados neste momento tentando retardar o avanço do inimigo. Eu preciso de um súdito leal para realizar uma simples missão de suma importância!
O fazendeiro de 18 anos que nunca havia matado nada na vida além de galinhas para o almoço olhou para o Rei Akinus e sua comitiva repleta de guarda-costas de brilhantes armaduras e reluzentes espadas e lanças e descobriu que aquele seria um dia comprido. Ele olhou mais uma vez para as armas dos soldados. Comparou com sua faca velha de descascar laranjas. Olhou para as armaduras e escudos pesados. E comparou com sua roupa suja que tinha mais buracos que remendos. Mas o Rei devia saber o que estava pedindo...
- Escute atentamente, fazendeiro. Este aqui é o poderoso Amuleto Escarlate de Syh, a fonte de todo o poder de Khala Khan. Se conseguirmos destrui-lo, a ameaça da Legião Sangrenta terá fim!
- E...?
- E eu preciso de alguém que possa cumprir essa missão! Deves levar o Amuleto Escarlate de Syh para o necromante Zaraphel. Ele saberá como quebrá-lo para sempre!
- Então, tá bom. Deixa aí pendurado na cerca.
- Devo alertá-te que Zaraphel vive no Pântano da Desgraça, nos limites do Reino.
- Pântano da... Desgraça?
- O único caminho é através da Ponte de Marfim, protegida pela Hidra de Sete Chifres. Para passar pelo monstro, tu precisarás da Espada Nihila.
- Espada Nihila? Imagino que Sua Majestade tenha trazido a arma e irá me...
- Nihila está guardada no fundo da labiríntica Caverna da Morte Infinita. Apenas um homem já retornou daquelas profundezas. Ele será teu guia nesta jornada
- Bem, pelo menos não irei sozinho...
- O ladino Gulfardo Veryluck encontra-se aprisionado por seus crimes em Gorath-Mor, a Prisão Flutuante sobre o Mar das Trevas. Deverás libertá-lo em primeiro lugar.
- Espere um pouco... agora eu tenho que anotar. Tem mais alguma...?
- Para conseguires entrar em Gorath-Mor você terás que passar pelos Sete Julgamentos da Virtude no alto da Montanha Intransponível. E sobreviver aos Golens de Diamante.
- Só isso?
- Acredito que Khala Khan deva enviar seus Assassinos Silenciosos para tentar recuperar o Amuleto Escarlate de Syh. Tu não deves permitir que isto ocorra!
- Nem me passou pela cabeça.
- É possível que, tão logo alcances Zaraphel, o necromante solicite algum favor em troca da destruição do amuleto. Não hesita em cumprir qualquer missão que Zaraphel te passe.
- Claro, como não? Tem mais alguma recomendação, Majestade?
- Apenas uma, leal súdito: pega o Amuleto Escarlate de Syh e parte imediatamente! O tempo urge e a Legião Sangrenta se aproxima!
Com um forte galope, o Rei e sua comitiva sumiram pela estrada. O fazendeiro pegou o amuleto, girou em seus dedos, avaliou o material. Parecia forjada nas entranhas do Inferno e era gelada ao toque. Arrumou um pedaço de queijo com pouco mofo, um pão fresco, um escudo feito de galhos trançados e tomou a estrada para a Montanha Intransponível.
Na fazenda seguinte, o Rei parou sua comitiva pela quarta vez e falou: "Aproxime-se, fazendeiro! Eu tenho uma missão para você!".
E tirou mais uma bijuteria da sacola.
3 comentários:
Fizestes-me rir, nobre escriba. :D
Que ótimo texto. Descreve bem alguns rpg's, aliás, vários, e está muito bem escrito.
Cara, eu espero não ter sido o único a entender a premissa deste texto.
É quase uma resenha de títulos genéricos que encontramos pelo mercado. É uma porta pra um diálogo filosófico e existencialista adentrando nas estranhas húmidas de glóbulos vermelhos das empresas que poduzem jogos sem paixão alguma, como se fossem parte de apenas uma linha de produção mórbida. É um convite à peste bubônica contemporânea chamada 'falta de criatividade', mas, pior que isso 'a falta de querer ter criatividade' Espero que desta fábrica de aventureiros saiam algumas singelas aventuras (;
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