Retina Desgastada
Idéias, opiniões e murmúrios sobre os jogos eletrônicos
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23 de novembro de 2010

Jogando: Left 4 Dead (Single-Player)

Como eu disse antes: Intenso, impecável, veloz e raso.

Bill Intenso: preste atenção aos ruídos. Eles nunca cessam. Eles sempre representam perigo. O barulho da Horda se aproximando. A dica sonora e o trovoar das passadas do Tank. O depressivo e inexplicado choro da Witch. Os asquerosos sons molhados emitidos pelo Boomer. O grito lancinante do Smoker. O ataque histérico do Hunter. Não há um minuto inteiro de Left 4 Dead em que o trabalho de áudio da Valve não tente te emergir em um universo de constante tensão. Neste pesadelo o som não apenas atrai os mortos, mas também estressa os vivos. Não há tampouco um minuto inteiro em que as armas de fogo não participem da conversação, em que cérebros e carne e sangue não jorrem na tela.

E não se esqueça de olhar as sombras. Mais uma vez, os sinistros desenvolvedores de Ravenholm brincam com as luzes e deixam o jogador aprisionado em uma situação de perpétua escuridão, onde o faixo da lanterna oferece pouca ou nenhuma segurança. Onde áreas previamente limpas podem se tornar a origem de um ataque traiçoeiro. Onde o conforto de um carro de polícia pode se transformar em um barulhento chamariz de zumbis famintos.

Francis Impecável:  A Valve pode ser uma empresa que desenvolve jogos a passos de tartaruga. Mas quando entrega o produto pronto, ele está pronto. A ausência de bugs é uma característica louvável de Left 4 Dead (e o que mais se poderia esperar de um título com atualizações constantes via Steam?). Em muitos momentos, nem parece ser a velha engine source em ação: as expressões faciais estão melhores, os filtros aplicados à imagem evocam antigos clássicos do horror, as texturas sujas simulam um nível de decadência agressivo e alguns níveis são capazes de exibir a verdadeira dimensão do fim do mundo com proporções épicas. Quem não se espantou com a queda do avião no aeroporto ou com a destruição no viaduto? Cada pixel neste jogo traduz com requintes de crueldade o pior pesadelo da Humanidade: o Fim.

Mais do que retratar o colapso civilizatório, o trabalho fabuloso de direção de arte se combina sutilmente com a jogabilidade. Left 4 Dead tem muitas portas, muitos caminhos, muitos cantos escuros a serem explorados. Mas em nenhum momento o jogador se sente perdido em relação a qual direção seguir. Sem mapas, sem bússolas, sem setas laranjas flutuando no ar, como é possível saber o caminho? Uma refinada utilização de dicas faladas pelos companheiros robôs, vielas mais iluminadas, ruínas metodicamente posicionadas, luzes caídas e, sem que você se dê conta, você está indo para o próximo refúgio. Genial.

Louis Veloz: Não há tempo para pensar ou planejar. Só há tempo para reagir. Neste ponto a Valve não pára para criar suspense: existem zumbis, existem zumbis às centenas e você terá que destruir todos eles. Não há aqui o medo imposto pela incerteza, como um Dead Space ou um Blood, e opta-se por seguir a cartilha de outros jogos frenéticos como Serious Sam ou Painkiller. Left 4 Dead não pode ser classificado assim como um legítimo survival horror da velha escola onde o medo da morte (ou do susto) acompanha o jogador  a cada instante. Left 4 Dead é o novo Doom, é o novo Quake, é Counter-Strike com inimigos de carne podre. O rugido da adrenalina se sobrepõe aos tiros e você clica ansiosamente pela próxima dose. E isso não é necessariamente um aspecto positivo.

Neste ritmo frenético que não permite ao jogador demarcar seu próprio ritmo, surge a Witch, a antítese da velocidade. A melhor estratégia contra tal criatura é apagar as luzes, avançar com cuidado e não perturbá-la. Ao contrário de todos os outros, ela pode ser evitada. A dúvida que pesa no peito é se será possível evitá-la. E, quando surge a mensagem na tela "You startled the Witch", você descobre que falhou e o medo te assalta, seguido pelo mais horripilante grito já inserido em um jogo. Ainda assim, eu vi mais de uma vez, em partidas multiplayer, jogadores mandando o suspense às favas e atacando a Witch, banalizando a aterradora (e digna de pena) vítima da infecção.

Zoey Raso: Quem diria que a Valve, uma das pioneiras na idéia de injetar enredo nos FPS, acabaria criando um jogo onde não há enredo? Não se engane pelas histórias em quadrinhos ou pela impressionante cena de abertura. Em Left 4 Dead não há explicações, não há reviravoltas, não há desenvolvimento de personagens. Não há cutscenes, não há um fim, não há um meio: tudo é uma contínua carreira em direção ao próximo refúgio, em diferentes cenários. E, mesmo quando os quatro sobreviventes conseguem o tão desejado "resgate", ele nada significa, por que na próxima campanha irá começar tudo outra vez. Left 4 Dead é uma brincadeira sem fim, onde mocinhos e bandidos se perseguem em arenas digitais, um esporte moderno, um jogo.

Esta falta de conclusão conduz à insaciabilidade, que amplia a vida útil do título para um infindável ciclo de partidas. Nem mesmo a morte tem significado, apenas uma rápida interrupção até o "quartinho" mais próximo. Em um título onde o suspense é zero, a morte não tem valor, e o horizonte não existe, o que sobra é uma interminável legião de zumbis famintos dos dois lados do monitor.

Left 4 Dead - My Screenshot 02 Left 4 Dead - My Screenshot 01Pontos positivos de Left 4 Dead (single-player): excelente trabalho de áudio e direção de arte; ritmo frenético; inteligência artificial aceitável. Pontos negativos de Left 4 Dead (single-player): falta de profundidade, falta de suspense. Nota final: 7,5.

Ouvindo: Sigue Sigue Sputnik - Supercrooked Blues

8 comentários:

Marcos A. S. Almeida disse...

Aquino , você sintetizou em uma palavra o que eu queria lhe dizer sobre L4D: RASO. É exatamente isso. E essa visão se agrava por você ser um "RPGsista" , que gosta de histórias e diálogos, coisa que ele definitivamente não têm.Quanto ao suspense eu acho que até existe , numa escala bem curta, mas é até compreensível, pois é evidente a vocação on line do jogo.Na verdade quando comecei á jogá-lo, acho que já comecei no modo on line e depois, muito depois é que fui experimentar o modo off line , o que foi um erro, pois agravou a minha opinião sobre os bots " burros". Enfim, é um grande jogo, mas é isso, é raso.

Rodrigo Ghedin disse...

Aquino, L4D foi feito para o multiplayer. Se joguei uma campanha no singleplayer, foi muito. Não é a proposta do jogo, e sozinho ele perde 90% (chutando raso) da diversão.

Junte uma galera (todos com microfone, por favor!) e saia em grupo. É a melhor experiência coop online que eu já vi num jogo.

[]'s!

Marcos A. S. Almeida disse...

Aí Aquino, Deus Ex - Invisible War á $ 2,49 no Steam...Mesmo sendo tão mal-falado , dá pra comprar só por curiosidade , não dá não?

C. Aquino disse...

Ouvi falar que não vale a pena nem de graça... Aliás, foram enfáticos a este respeito! Até por US$2,50 eu compraria outra coisa...

Bruno disse...

Faz muito bem, Aquino. Faz muito bem.
Ninguém gostaria de pagar p/ sentir-se frustrado e irritado.

Quanto ao L4D, não seria justamente esta falta de história que dá uma sensação de realidade ao jogo? Convenhamos, mesmo inimigos mortais esqueceriam as diferenças e trabalhariam juntos caso isso significasse a sobrevivência. Neste cenário, não importa muito o passado, os sonhos, aspirações, desejos e etc. Estariam todos unidos pelo animalesco instinto de sobrevivência. Pelo que li até agora sobre o jogo, nenhum dos personagens são heróis. São apenas pessoas comuns pegas de surpresa pelo apocalipse tentando se manter vivos pelo máximo de tempo possível.

Só lembrando que pergunto do ponto de visa de alguém que nunca jogou L4D.

Fagner P. disse...

Concordo em todas as palavras com o que o Bruno disse.

Só que eu ja joguei L4D, porém multiplayer, e como o Rodrigo Ghedin disse, é até melhor jogar uma boa partida de L4D com 3 amigos (com microfone), do que sair com eles pra tomar uma gelada no bar da esquina.

Marcos A. S. Almeida disse...

Bruno , o que você disse sobre a falta de história tornar o jogo mais real não é uma regra, e acho que você pensa assim também.E no caso de L4D essa falta de história só realça a sua vocação on line e não o deixa mais real.Na verdade quando joguei L4D pela primeira a sensação que eu tive foi de " já começou"?? , pois já aperecemos no alto de um prédio , com armas e munição á nossa disposição ,prontos para a ação e com os infectados fungando bem próximo dos nossos ouvidos.Quer dizer , zero de história e zero de narrativa, ao contrário do que estamos acostumados ao iniciar-mos em um jogo.Acho até que se não fosse o ótimo vídeo de abertura ( que acho eu, pulei da primeira vez...) iríamos ficar totalmente perdidos.E mais um dado que também reforça essa vocação on line:mesmo no modo single player, podemos escolher qualquer campanha ou fase, sem sequência, sem precisar fechar uma para completar outra.E porque isso é possível? Porque é um jogo on line, sem história e sem narrativa.
Quanto a opinião do Fagner P. , no que diz respeito á sair para um bar, HOJE eu concordo plenamente, do alto dos meus 35 anos de idade, mas nem sempre pensei assim...
Agora porque tanta gente gosta de jogar on line falando ao microfone??Na verdade , só sai xingamentos, gozações e comentários sem importância.Não vejo graça.Á não ser que exatamente isso seja a graça...

Marcel Skywalker disse...

É, parece que o Aquino não foi o único com experiências multiplayer ruins rs.

O uso do microfone em partidas online vai além dos xingamentos e comentários sem importância.

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