Talvez o post anterior tenha dado a impressão errada que eu estava defendendo somente o direito do jogo Fallout 3 ter sua propaganda espalhada por toda parte. Pouco me importa se a Bethesda vai vender mais ou menos unidades do jogo devido à censura imposta ao marketing. O que realmente incomoda é a negação dos fatos, é a recusa em discutir a mais remota possibilidade do pesadelo atômico se concretizar: Fallout 3 acidentalmente mencionou um tabu que se julgava extinto.
A série Fallout sempre usou de sarcasmo para amenizar os horrores do tema delicado que abordava. O sarcasmo tem a vantagem de facilitar a assimilação de assuntos controversos, sem que o receptor se dê conta. Reconstituindo o clima de otimismo e paranóia nuclear dos anos 50 (apesar da história ser ambientada no futuro), a série expunha o ridículo de uma época despreparada para assuntos tão sérios. Entre uma piada e outra, o jogador ia se afundando na distopia de uma sociedade profundamente marcada pelas consequências de uma guerra sem sentido.
Apesar da remoção do trailer do terceiro jogo em todos os sites da Internet, ainda é possível encontrá-lo no YouTube (onde mais?). A fina ironia presente no descaso do falso comercial de TV está lá, o absurdo da suposição de normalidade em um anúncio de abrigo nuclear. O quanto dessa crítica sutil foi colocada de fato no jogo permanece um mistério para mim, por enquanto.
Enterrando a Cabeça em um Buraco
O comportamento daqueles que preferem ignorar a verdade batendo em suas portas nos remete de volta ao começo da Guerra Fria. Como a célebre tartaruga do filme "Duck and Cover", eles acreditam que tudo pode ser facilmente resolvido se abaixando e procurando cobertura. Talvez um dos mais significativos vídeos educacionais de um período assustador, o curta descreve para os estudantes primários americanos como se "proteger" de um ataque nuclear. Desenvolvido pelo governo para amenizar o medo da população, as instruções contidas no vídeo da Defesa Civil são praticamente inúteis contra a eventual guerra atômica em larga escala. Divulgado em escolas, esta patética e ingênua peça de propaganda retrata o sentimento de uma nação entorpecida.
Mas a nova Guerra Fria está aí. Ou nunca foi embora. Por uma dessas sinistras coincidências, foi motivo de uma (excelente) matéria no Globo Online. Não adianta se esconder. Não adianta fugir do debate. Não adianta remover os cartazes incômodos, os trailers proibidos e os anúncios dos pontos de ônibus.
Os mísseis ainda estão lá, adormecidos em seus berços de concreto, aguardando ordens que espera-se que nunca cheguem.
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