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6 de março de 2023

Eu Vi: Cyberpunk Edgerunners

cyberpunkUma das lições mais duras do gênero cyberpunk eu não aprendi lendo Neuromancer ou Snow Crash, ou assistindo Johnny Mnemonic. Eu aprendi na prática. Bem, na prática de uma mesa de RPG, mas essa mídia também foi um dos pilares do movimento.

Meu time de jogadores estava vindo de longas campanhas em mundos de fantasia, usando o simplista sistema de Aventuras Fantásticas. No ápice da adolescência, resolvi adotar não apenas um sistema mais maduro como também uma temática mais edgy. Estou falando do infame GURPS Cyberpunk. O salto de estética, regras e complexidade foi gritante. Mais gritante ainda foi a percepção de que nesse futuro distópico a vida humana não tem valor algum e a maioria das armas pode destruir carne e cromo com um único tiro, não importa quão bem montado seja seu personagem.

A brutalidade me pegou de surpresa no meio da aventura. O impacto foi tão forte que aquela campanha jamais foi encerrada. Meu cenário seguinte, desenvolvido internamente, partiu justamente do princípio de que os protagonistas seriam imortais.

Em Cyberpunk Edgerunners, pela segunda vez, vi esse princípio novamente em ação: nesse futuro distópico, a vida humana não tem valor algum. Em uma fração de segundos, pelos motivos mais banais, um personagem pode se transformar em uma nuvem de sangue, rebites e carne queimada. E é justamente nesse universo selvagem das ruas que se constrói uma história que contrapõe essa máxima com lealdade e sacrifícios. Não há mocinhos na luta pela sobrevivência, o bem não triunfa sobre o mal, violência é a moeda principal de Night City e, mesmo assim, desenvolvemos laços de empatia com esses personagens e percebemos ali que viceja uma grandiosidade, uma bondade que se esforça para emergir do concreto.

A série de animação acompanha David, um garoto da classe baixa que frequenta uma escola para estudantes de classe mais alta. Sua mãe se esforça para pagar a mensalidade, para que David quebre essa divisão de castas. Porém, uma tragédia empurra o jovem para os braços abertos do submundo, da raiva e de uma improvável relação com uma hacker que vive de pequenos crimes. Daí pra frente, a trama nos apresenta uma trupe de pessoas que vivem na beira da sociedade, coletando as migalhas de serviço sujo que escorrem das grandes corporações. Sempre há um peixe maior nessas águas, é preciso estar atento, mas esse grupo acabará se tornando a nova família de David.

Cyberpunk-Edgerunners-Rebecca

Cyberpunk Edgerunners é inspirado no jogo Cyberpunk 2077, da CD Projekt, que, por sua vez, é inspirado no universo do RPG Cyberpunk 2020. Mídias distintas, atmosferas similares. Almas condenadas desde o começo matam e mutilam em busca de alguns dias a mais de sobrevivência, em busca do reconhecimento que a sociedade lhes nega, em busca de conforto, em busca de sentido, mesmo sabendo de antemão que serão chama, fadados a apagar ou consumirem a si mesmos. O que a animação injeta é uma estética ancorada nos animes, uma trilha sonora nervosa e cativante e cenas de ação que seriam impossíveis de serem feitas em um jogo eletrônico ou na imaginação do mestre de RPG mais febril.

Entretanto, Cyberpunk Edgerunners vai além das obras que o antecederam. Há algo de melancólico e trágico nessas vidas perdidas em segundos partidos. Mais do que números em uma planilha, esses personagens se revelam dramáticos. Baixada a adrenalina, o que sobra é a dor, a lágrima que não cai e a boca ligeiramente aberta com um palavrão contido.

Cyberpunk-Edgerunners-Moon

Ouvindo: 1337 G33K B3AT - Emulation Station

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