Retina Desgastada
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9 de novembro de 2017

(não) Jogando: Pokémon Uranium

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Pokémon Uranium certamente é mais conhecido do que efetivamente jogado, desde que chamou a atenção da Nintendo, que barrou a distribuição do jogo feito por fãs. São duas injustiças aí: a primeira é a gigante japonesa ter se posicionado contra um título gratuito, uma homenagem desenvolvida para uma plataforma na qual os personagens nunca estiveram e nunca estarão presentes.

A segunda injustiça é o fato de você não estar jogando Pokémon Uranium agora.

Criado apenas por dois fãs (um brasileiro e um americano), usando a mesma ferramenta utilizada por todos os fan games de Pokémon (incluindo o já analisado aqui Pokémon Island), Pokémon Uranium consegue injetar personalidade e desafio na medida certa em uma comunidade que costuma apenas caminhar sobre os passos já dados pelos orientais.

A fórmula é a mesma de Pokémon Island e possivelmente inúmeros jogos, incluindo os oficiais: você cria seu personagem, escolhe seu Pokémon inicial e é solto no mundo, enfrentando um número esmagador de batalhas quase repetitivas, enquanto aumenta o nível de suas criaturas em busca da vitória nas mais complexas batalhas de ginásio. Não sou um profundo conhecedor dos jogos de Pokémon (esse é o segundo), mas tudo indica que é o arroz com feijão que os fãs adoram, não se mexe em time que está ganhando e a profundidade do jogo brota mesmo é da dança dos números e das infinitas combinações de ataque e defesa.

Mas Pokémon Uranium inova ao introduzir criaturas que não fazem parte do cânone, mas se mesclam perfeitamente com a vasta fauna/flora do universo Pokémon, a ponto de eu precisar consultar a Wiki oficial para descobrir que esse ou aquele não existe em nenhum outro lugar além do mundo de Pokémon Uranium. Há as criaturas radioativas, que nada mais são que troca de palheta e poderes de monstrinhos já conhecidos, mas há também uma boa quantidade de seres totalmente inéditos e profissionalmente ilustrados.

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Mas a criação desses dois fãs não se contenta com esse feito e também insere algo que fez muita falta em Pokémon Island: enredo. Há uma história pregressa do personagem principal que será mencionada ao longo de sua jornada, uma morte traumática que abrirá portas para grandes mistérios, uma divertida rivalidade com um vizinho arrogante e eventos programados que irão alterar o mapa e adicionar uma boa dose de perigo ao jogo. Até mesmo as missões secundárias são bem pensadas, caindo de cabeça no lado non sense dos desenhos animados, com super-heróis, clãs de ninja, robôs alienígenas e outras bizarrices.

Cada vila e região transborda atmosfera, o que é surpreendente considerando a limitação gráfica com que seus criadores trabalharam e seu suposto amadorismo. Jogando Pokémon Uranium é possível entender por que a Nintendo se incomodou com essa produção e deixou todos os outros fan games com o mesmo tema incólumes durante todos esses anos.

Pé Na Estrada

Instalei o jogo pensando no meu filho, é claro, embora eu mesmo tenha acompanhado bem de perto o que se transformou em uma febre para ele em 2016. Buscava orientá-lo nas artes da estratégia e traduzia os textos dos diálogos, mas as decisões importantes, como a composição de seu time, ficavam a critério dele. Logo, ele entendeu como funcionavam as batalhas e me tornei apenas um intérprete.

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(nas madrugadas, perambulava pelos arbustos, desafinado Pokémons selvagens e subindo os níveis das criaturas dele)

Vi com orgulho ele conquistar sua primeira insígnia de ginásio totalmente sozinho e me senti como a mãe do Ash torcendo pro guri.

Por ser um jogo leve, foi instalado no netbook da mãe e levado em viagens. Foram dias de glória na virada do ano, passeando durante o dia e jogando Pokémon Uranium no quarto de hotel. Logo estávamos jogando no ônibus de viagem, no táxi entre cidades, onde sobrassem vinte minutos livres. Viajávamos em dois mundos.

A febre continuou por meses e de todas as insígnias possíveis de ginásio, ele não conquistou somente uma, a da fatídica vila do gelo.

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Cadê o Hexa?

A essa altura, ele jogava muito mais sem minha companhia do que comigo ao seu lado e foi cometendo pequenos deslizes. Escolhia Pokémons pela simpatia, não pelos poderes ou seu papel no time. Colocava apenas seu Pokémon favorito na frente de todas as batalhas (seu inicial, o agora evoluído, elegante e totalmente não-canônico Metalynx). Não grindou como eu vivia dizendo para fazer (e, vamos combinar, grindar é chato).

O resultado é que ele tinha um campeão muito acima do nível da região e todos os demais abaixo do nível das criaturas do ginásio. Como a Seleção Brasileira, construiu seu time escorado no talento de um único craque, o que, como já vimos nas últimas Copas, é o caminho para a derrota. Por mais poderoso que Metalynx fosse, ele tombava contra criaturas contra as quais não era efetivo ou era enfraquecido a conta gotas, diante da barragem de luta após luta. Caindo Metalynx, o time vinha logo depois.

"Você vai ter que evoluir o resto do time", foi o que eu disse para ele quando me trouxe o problema e eu vi sua composição. Mas os arredores da vila envolviam os puzzles de escorregar no gelo, até mesmo para passear sem preocupação e combater Pokémons selvagens. As criaturas ao redor eram impiedosas contra seu time de nível inferior e ele precisava retornar constantemente para o Centro Pokémon para curar todos, encarar de novo os puzzles, travar mais batalhas.

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Como toda criança de dez anos que se preze, perdeu o interesse no jogo que amou durante quase um ano, tendo chegado tão próximo da vitória. E Pokémon é um gênero brutal: você não joga, você esquece como jogar, você é derrotado, o interesse se esvai mais ainda. Meses se passaram e Pokémon Uranium permaneceu intocado, vítima de sua terceira injustiça.

Até que ele me pediu para remover o jogo. Fiquei curioso em saber como terminaria a trama, tentei grindar eu mesmo, mas... há outros títulos instalados, o grind é implacável. Pokémon Uranium terá que sair.

Curiosamente, perguntei a ele que tipo de jogo deveria substituir Pokémon Uranium no PC. Ele nem hesitou: "outro jogo de Pokémon". Vai ser difícil encontrar outro à altura do trabalho e da dedicação depositados nesse aqui, mas cumprirei minha missão: temos que pegar todos.

Ouvindo: Megadeth - She-Wolf

2 comentários:

disse...

Se for do seu interesse, o mais perto que Pokemon tem de um jogo com enredo são as versões Black & White do DS

Michael Andrade disse...

Se bem que para um garoto de 10 anos, o enredo não é preciso ser tão forte pra prender a atenção. Seria interessante acompanhar o progresso dele nos antigos, da época Fire Red, com pokemons clássicos e gráficos bonitinhos também. Seria engraçado saber como ele levaria agora já tendo uma ideia de que é preciso fortalecer todos do time. Tenho certeza de que dá pra baixar uma ROOM pro Fire Red que seja traduzida. Ou deixa ele jogar no inglês mesmo e se virar como era na época em que só se sabia o que significava start e game over hahaha.

Ai de tempos em tempos você pede pra ele dizer um pouco sobre o que está achando do jogo e o que já aconteceu e você o parafraseia em algum post.

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Blog criado e mantido por C. Aquino

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