Retina Desgastada
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12 de maio de 2017

E o Jornalismo de Jogos?

acao-gamer

Felipe Pepe, o pesquisador brasileiro autor do The CRPG Book Project, preparou outro petardo para dar uma sacudida naquilo que chamamos de jornalismo de jogos no Brasil. A longa crítica está repercutindo nos bastidores e merece a conferida.

Destaco aqui alguns trechos:

(...) a mídia atual se desconectou da comunidade. Quer coisa assim, vai ler fórum, guias no Steam ou Youtubers especializados. Lá é que se colabora, pensa e cria; na imprensa o foco é o hype.

(...) No Brasil, o que se traduz é press release de lançamentos AAA. O que não faz sentido — quem se importa com PS4 e Xbox One muito provavelmente tem grana, sabe inglês e poderia ler o press release original no Kotaku.

Não adianta posar de engajado social no Facebook e Twitter se depois vai escrever como se morasse em Miami. O atual jornalismo de games brasileiro é elitista e completamente desconectado da realidade do país.

(...) Isso afeta tudo. Se as notícias do momento são pautadas pelo hype gringo, o passado é pela nostalgia BR. São sempre as mesmas histórias: “Battletoads que era difícil, meo!”, “Mega Drive ou Super Nintendo?”, “Final Fantasy VII foi meu primeiro RPG!”, “Allejo mito!”, etc.

O foco é o “ah, eu também lembro!”, raramente o “nossa, não sabia!”

(...) Hoje é mais fácil encontrar boas entrevistas e artigos detalhados em blogs minúsculos e sem nenhum apoio. As grandes personalidades estão ocupadas sendo grandes personalidades.

O texto completo foi disponibilizado no Medium e vale quinze minutos do seu tempo, quer você trabalhe na área ou não.

Lembra meu desabafo raivoso contra a blogosfera gamer de alguns anos atrás. Parte daquela fúria que eu sentia amansou com o tempo, mas vejo que os problemas continuam ou até se agravaram entre os sites agora ditos profissionais. E os blogs? Extintos ou escondidos.

A impressão que me fica, e espero estar errado, é que ainda existe muito deslumbre e pouco jornalismo na área. Deveria haver um entrosamento maior com a realidade brasileira, inclusive com a indústria de desenvolvimento brasileira que está na sua melhor fase e frutificaria muito com uma cobertura melhor da mídia.

Mas são culpados os profissionais? O público não consome porque a mídia não oferece ou a mídia não oferece porque o público não consome? Uma notícia sobre o Call of Duty do ano, por mais reles que seja, gera mais cliques que um artigo profundo sobre como funciona a otimização de recursos de geração de cena de um jogo ou um levantamento da história dos FPS. Um vídeo de um sujeito se esgoelando enquanto joga um survival horror tem 100 vezes o número de visualizações de uma análise bem trabalhada do level design de Quake.

E a grande mídia vive de anúncios. E os anúncios geram renda em um momento em que o dinheiro está escasso no país, seja lá de quem for a culpa. Quem não quer ganhar bem fazendo aquilo que gosta? Nas engrenagens brutais da regra do mercado, o jornalismo de jogos precisa olhar para si mesmo e se definir: informativo? Entretenimento? Talk show? Raso ou profundo? Tudo ao mesmo tempo?

São respostas que não tenho, transito por quase todos os lados da questão, publicando artigos obscuros por aqui, divulgando Call of Duty ali, tentando um meio termo acolá.

E você? Quer ser um jornalista de jogos?

Ouvindo: Fatal Morgana - Lifeblood

8 comentários:

disse...

Tudo que foi dito se aplica a todo o jornalismo na verdade. Quando não é apenas tradução (muitas vezes ruim) de agencias de noticias ou press release, é clickbait barato.

Por isso eu gosto desse blog, tu realmente tira dois minutos do seu tempo para falar e não apenas joga no google translate e era isso

Luiz Antônio disse...

Só li verdades!

Só pra fazer um adendo a respeito dos lançamentos AAA: Não é todo mundo que tem 5 ou 6 mil (ao menos esses eram os valores quando pesquisei a um tempo atrás para montar o PC do zero) pra montar um PC que rode GTA V, The Witcher 3, Doom, Fallout 4 e Batman: Arkham Knight no talo e lisinho.

É muito mais acessível gastar 2 mil num console e ser feliz rodando o jogo sem ficar se preocupando se precisa mais memória, se tem que comprar outra placa de vídeo, outro processador, motherboard, etc...

Longe de mim fazer apologia aos consoles, adoro meu PC e me divirto muito com ele rodando os jogos mais antigos, mas essa é a realidade daqueles que tem uma graninha e querem jogar um lançamento AAA sem precisar vender um rim para isso. Claro que o fato dos jogos de PC serem mais baratos conta. Mas isso é mais importante para aqueles que tem mais tempo para jogar e que, por isso, consomem um numero maior de jogos. Mas se levar em conta o exemplo de alguém que não tenha tanto tempo para jogar, ele pode comprar um console e o jogo Fallout 4 ou The Witcher 3 e terá diversão garantida por, no mínimo uns 6 meses sem se preocupar em comprar outro jogo.

Sobre as questões:

"Mas são culpados os profissionais? O público não consome porque a mídia não oferece ou a mídia não oferece porque o público não consome?"

Sempre me perguntei isso a respeito de musica boa e a breguices que ocupam 99,9% dos espaços na mídia e nunca consegui chegar a uma conclusão definitiva. No caso da musica, acho que tem mais a ver com o mau gosto da maioria, mas também acho que a mídia poderia refinar esse gosto tosco dos consumidores se quisesse.

eu disse...

Eu sinto falta das comunidades do orkut, tinha muita coisa boa ali, discussões esmiuçadas de todas as formas,

Vagner VD disse...

Eu meio que desisti do jornalismo de games depois da treta do Gamesfoda. Até teve momentos em que eu pensei "olha só", como o Drops de Jogos, mas no final eles sempre decepcionam.

Shadow Geisel disse...

"Nintendo Switch e Zelda: Breath of The Wild, Horizon: Zero Dawn, Scorpio, PS4 PRO,VR…esses são os grandes temas da mídia nacional. Jogos aos quais uma parcela mínima da população — mesmo entre os gamers — têm acesso.
É como se a revista Quatro Rodas fosse focada em Ferraris e Porsches.
Como chegamos a esse ponto?"

Trecho extraído do texto original.

Desculpe, mas me soa como mimimi assistencialista. Não sei se o escritor sabe, mas jogar videogame nunca foi barato nesse país. Pegar exemplos de jogos que foram lançados há um ou dois meses e salientar o fato óbvio de que apenas uma esmagadora minoria vai poder comprá-los não vai mudar o fato de que vivemos em um país de carga tributária predatória, que impossibilita o consumo de qualquer meio de entretenimento mais voltado pra produtos de tecnologia. Ele mesmo ressalta no texto que existem VÁRIAS alternativas baratas pra quem não pode pagar o preço de uma prestação de apartamento em um jogo de lançamento. O que se deve fazer em uma época de E3 como esta, então? Colocar antolhos na cara e fingir que a notícia mais empolgante do ano é o lançamento do Genesis por R$450,00 nas Casas Bahia? Também existe o fato de que mesmo aqueles que possuem consoles, como meu caso, se valem de promoções e recursos como PS Plus pra jogar sem ter que morrer de fome no final do mês. Acima de tudo, jogar games nesse país exige paciência. O problemático Street Fighter 5 da Capcom foi lançado há pouco mais de um ano, por absurdos R$250,00. Hoje custa R$45,00 no Submarino. Subestimar os sacrifícios que os jogadores fazem pra acompanhar seus jogos mais esperados ou achar que a mídia deve ignorar o que está sendo alardeado não é um bom jeito de incentivar o mercado e tentar incluir os brasileiros nessa brincadeira. Minha opinião, claro.

Rabisco Virtual disse...

Em meu humilde ponto de vista, a culpa é mútua. Imprensa, público, desenvolvedoras, todos adotaram posturas que convergem para o mesmo buraco, digo, para a mesma poça, considerando que atualmente a regra diz que tudo deve ser raso.

Eu raramente converso sobre videogames com outras pessoas, mesmo com aquelas que jogam. A maioria esmagadora está interessada apenas nos lançamentos do momento, nos "competitivos", nas grandes marcas de hardware e youtubers.

Levantar questionamentos sobre a relação do comportamento humano relacionado aos jogos, ou mesmo discorrer sobre assuntos técnicos da produção de um game, é passaporte garantido para a terra do ostracismo em meio a própria tribo...E é desconfortável ser um "estranho em meio aos estranhos".

A era que deveria ser da informação, está tomada de alienação, vinda uma ignorância alimentada pela indústria. Parece uma síndrome de Glória Pires, incapaz de opinar em seu próprio universo.

Ano passado participei de um evento relacionado a jogos e cedi meu computador ao público. Em mais de 100 jogos disponíveis em minhas bibliotecas, quem se aproximava da máquina perguntava por Counter-Strike, Dota e League of Legends, davam de ombro e viravam a esquina com cara de desdém, ao não econtrarem tais títulos. Em um outro evento também relacionado a games, abortamos um workshop de ferramentas para produção de jogos por não haver público interessado.

disse...

Acho que o pessoal está focando na parte irrelevante da materia original. A coisa da renda não é o ponto importante aqui, mas a falta de conteúdo sim. Quer dizer, você consegue identificar a linha editorial do Polygon, Kotaku ou IGN lendo uma resenha deles (mesmo que eu não goste, mas isso é outra coisa). No Brasil não tem nada assim. Qual é o grande portal de games com uma linha editorial, com uma linha de dialogo com o publico?

O Jovem Nerd e o Omelete, por exemplo, só traduzem press release ou vomitam senso comum - mesmo que eles tenham suas linhas editoriais para outras areas, como no cinema.

Fernando Lorenzon disse...

Eu lia muitas revistas de games, mas fui aos poucos parando justamente por ter me cansado da fórmula da mídia em falar dos grandes jogos que cada vez mais eu me distanciava. Encontrei muita diversão nos indie games e fui aos poucos me distanciando dos AAA, que eram os únicos games cobertos pela imprensa tradicional.

Aí comecei a ler blogs de games e também me cansei (com raras exceções) porque a maioria dos blogueiros são fanboys de franquias e não falam de outras coisas.

Encontrar boas opiniões e pensamento crítico no meio texto-gamístico é complicado. Por causa disso, voltei a escrever num novo blog.

Retina Desgastada

Blog criado e mantido por C. Aquino

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