O pessoal do Rock, Paper Shotgun está incomodado com a pré-venda de Rage. Os felizardos que toparem pagar pelo jogo antes do lançamento terão acesso à exclusiva Double-Barred Shotgun. Eu já destilei minha fúria a respeito do conteúdo exclusivo no ano passado, então não adianta mais chorar sobre o leite derramado: a pulverização do conteúdo dos jogos é uma realidade inevitável e azar de quem tem orçamento limitado. Mas este é apenas mais um equívoco somado a tantos outros no lançamento de Rage.
A poderosa Zenimax não liberou acesso prévio ao jogo para a imprensa. Com o título chegando na próxima semana, consumidores estão sendo incentivados a fazer a pré-compra baseados apenas em um punhado de trailers e telas, sem nenhuma análise, balanceada ou não, a respeito do jogo. Tampouco haverá uma versão demo. Embora o título esteja sendo desenvolvido pela id software, seu primeiro jogo sete anos depois de Doom 3, quem deu a má notícia sobre a versão demo em Janeiro foi Pete Hines, da Bethesda (negrito por conta da casa): "Isto é algo que nós sempre procuramos para cada jogo e nós fazemos quando possível e quando apropriado. Mas, para ser completamente honesto, do ponto de vista técnico, nem sempre é possível. Eu não vejo um demo para Rage a caminho". A despeito da declaração de Hines, não existe tampouco versões demo para Fallout 3, Fallout: New Vegas, Brink, Wet, Hunted: The Demon's Forge, The Elder Scrolls IV: Oblivion ou qualquer outra coisa publicada pela Bethesda/Zenimax nos últimos dez anos. Em 2009, Todd Hollenshead, chefão da id software, comentou que o jogo teria demo. Aliás, como todos os jogos da id software, até agora.
(Em 10 de Dezembro de 1993, o servidor de FTP da id software ficou congestionado de visitantes ansiosos para baixar o demo anunciado do primeiro Doom. A situação foi ridícula, porque o excesso de usuários impedia que Jay Wilbur, da id software, conseguisse conexão para subir o arquivo do jogo. Havia centenas, talvez milhares de jogadores simultâneos esperando o demo aparecer na listagem de arquivos. Wilbur telefonou para o administrador do servidor, que imediatamente liberou uma vaga. No espaço de tempo em que Wilbur desligou o telefone, a vaga já tinha sido ocupada por outro usuário. Nova ligação e o administrador liberou dez vagas. Wilbur tentou de novo e de novo o servidor estava cheio. Através da Usenet se espalhou a notícia de que o jogo não iria aparecer enquanto as pessoas não se desconectassem. Lentamente, muito lentamente, o servidor foi sendo desocupado. Quando Wilbur finalmente conseguiu se conectar e começou a subir o jogo, os jogadores começara a baixá-lo antes mesmo de Wilbur terminar. Anos depois, o demo de Doom II seria baixado dez milhões de vezes no lançamento.)
Em 2009, a Zenimax adquiriu a id software. Entre as estratégias comerciais implantadas pelo gigante corporativo está claramente o fim da divulgação de versões demo. Também foi declarada guerra ao mercado de usados, com conteúdo de Rage bloqueado para quem não comprar uma cópia nova. A comercialização de licenças de uso das engines gráficas, uma das grandes fontes de renda da id software durante a década passada, também foi alterada. Os interessados em utilizar a poderosa id tech 5 deverão obrigatoriamente publicar seus títulos sob a bandeira da Zenimax.
A César o que é de César
Mas o que é a Zenimax? O que é Bethesda? O que é id software? Ainda que em dias de promoção no Steam tudo pareça ser a mesma coisa, há de se separar o joio do trigo.
Os limites entre Zenimax e Bethesda são meramente jurídicos. A Zenimax Media foi criadas nos Estados Unidos em 1999 por dois dos fundadores da Bethesda, Christopher Weaver e Robert A. Altman. Na prática, a Bethesda segue como desenvolvedora e publicadora de jogos, mas o braço empresarial e financeiro atende pelo nome de Zenimax. Pode-se dizer também que Bethesda é o lado público da Zenimax, em contrapartida aos engravatados do alto escalão.
Ainda que diversos títulos tenham saído com o nome Bethesda impresso em letras garrafais em sua publicidade, a granda maioria deles não compartilha do padrão de qualidade da franquia Elder Scrolls e foi desenvolvida por estúdios terceirizados ou subsidiárias da gigante Zenimax, como se tornou a id software. É um caso muito parecido com o que acontece com a Valve. Nestas horas é melhor não confundir a criadora de Elder Scrolls III: Morrowind e Fallout 3 com a desenvolvedora de um Wet, digamos assim.
De 2000 para cá, a equipe de desenvolvimento da Bethesda só pode ser responsabilizada por Morrowind, Oblivion e Fallout 3. Vejamos os outros:
- Call of Cthulhu: Dark Corners of the Earth: Desenvolvido pela Headfirst Productions, que faliu após problemas com a Bethesda em relação às finanças.
- Star Trek: Legacy: Desenvolvido pela Mad Doc Software, que foi comprada pela Rockstar e transformada em Rockstar New England.
- Wet: Desenvolvido pela Artificial Mind and Movement, que se transformou na Behaviour Interactive.
- Brink: Desenvolvido pela Splash Damage, que já havia trabalhando anteriormente com a id software.
- Fallout: New Vegas: Desenvolvido pela Obsidian.
- Hunted: The Demon's Forge: Desenvolvido pela inXile Entertainment.
- Rogue Warrior: Desenvolvido pela Rebellion.
E mesmo os próximos e aguardados lançamentos, alardeados como produtos da Bethesda, na verdade estão sendo desenvolvidos por outros. Além de Rage, temos Prey 2, que está nas mãos da Human Head Studios e Dishonored, ao encargo da Arkane Studios.
Gradualmente a Zenimax vai consolidando o nome da Bethesda em uma marca a ser reconhecida pelo grande público, removendo aquela imagem de desenvolvedora de RPGs de mundo aberto.
Que outras mudanças a Zenimax planeja para os títulos e empresas em seu portifólio de produtora, é algo que apenas o futuro pode dizer. Será mesmo? O sempre polêmico John Romero, ex-funcionário da id software, pode ter tido seu dia de profeta, logo após o anúncio da compra da id pela Zenimax. Em suas próprias palavras: "ZENIMAX??????? Revoltante."