Retina Desgastada
Idéias, opiniões e murmúrios sobre os jogos eletrônicos
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14 de junho de 2011

Off-Topic: Crônica de uma Fonte Queimada

Estou trabalhando em casa desde fevereiro, como meu próprio chefe. Não é o mar de rosas que muitos imaginam porque tem seus solavancos. Um deles acontece quando seu computador se recusa a ligar.

Normalmente, Indigo nunca é desligado. Uma reinicialização aqui para instalar atualizações do Windows, outra ali por travamento. Mas desligar? Quase nunca. Na segunda-feira de tarde, repleto de coisas para fazer, tomando conta de meu filho febril, caí na asneira de tentar (outra vez) colocar o laptop de minha esposa em rede. Reativei minha placa de rede sobressalente, alterei o TCP/IP como manda o figurino e desliguei o computador. Sabe como é. Desligar é sempre melhor que reiniciar quando tem uma peça nova na história. Ou isto é superstição de quem viveu o Windows 95, não sei. Só sei que desliguei.

E vi, em pânico, que o botão de ligar não produzia efeito algum. Nem luz, nem beep, nem barulho de ventoinha. Nada.

Como todo profissional inconformado que acredita que pode resolver sozinho, troquei o cabo de força, troquei a tomada, liguei e desliguei o no-break, abri a CPU, olhei a poeira dentro do computador, conferi as conexões. E me conformei. Tinha pifado.

Liguei para minha esposa que estava voltando do trabalho e colocamos tudo dentro do carro: criança febril, computador pifado, pão de queijo para o primeiro. Corri para uma loja que eu conhecia, mas nunca tinha usado. Chegamos lá faltando meia hora para fechar. Meu dia estava perdido. Mas pensava na terça-feira. E no trabalho acumulado. E no PC Game Wallpapers. "Acabei de lançar o site" e já vai ficar sem sua atualização diária no segundo dia?!". A dona da loja deu o veredicto: "são até cinco dias para dar o orçamento, o orçamento aprovado, a gente conserta". Cinco dias? Como assim? Eu preciso dele! É meu ganha-pão! "Para amanhã é impossível, liga no fim do dia para a gente ver o que dá pra fazer".

Indigo ficou na loja e eu fiquei desconsolado. Fui pra casa pensando em alternativas. Fui dormir pensando em alternativas. Acordei pensando em alternativas. Nem a pau que eu ia esperar dias para consertar minha máquina. Entra em cena, o Pintado.

Moro colado com uma "comunidade carente". Uso aspas porque de "carente" eles tem muito pouco: todos trabalhadores, ruas asfaltas por um plano do governo anos atrás, luz, água encanada, rede de esgoto, comércio e nenhuma violência além da ocasional briga de bêbados no fim de semana. Faço compras ali, mas nunca me ocorreu perguntar se tem loja de informática. Pois fui lá e perguntei se havia alguém que consertava computadores. Um tal de "Pintado" perto da Associação de Moradores faz consertos. Com esta tênue referência e uma grande dose de confiança, resolvi tirar Indigo da loja e correr atrás.

Pergunta daqui, pergunta dali e o cara do bar falou que "desce por aqui, entra na primeira esquerda, sobe a ladeira, chega no portão azul que tem um buraco assim, puxa para abrir o portão, o Pintado mora na primeira casa". Na verdade, é mais fácil do que parece e eu encontrei a casa do Pintado: prancha velha de surfe pendurada na parede, colchonete no chão com um sujeito, uma mulher e um bebê de colo sentados, área de serviço colada na sala, dois monitores em cima de uma bancada. O sujeito tinha roupa colorida de hippie, cabelo de hippie, voz lenta de hippie e olhar perdido de hippie. Era o próprio Pintado.

Um aperto de mão e eu já tinha certeza que o atendimento seria nota dez.

Expliquei o problema para ele, ele me explicou quanto cobra e garantiu que ia resolver no mesmo dia. Metade do dia já tinha ido embora. Pintado pegou meu telefone e avisou que ligaria quando estivesse pronto. Nada de Ordem de Serviço, anotar o número de série do computador ou "liga no fim do dia que a gente vê". Um novo aperto de mão, firme e sincero, e eu tive a certeza de que o serviço seria do mesmo nível que o atendimento.

Fui pra casa sem saber como lidar com meu tempo livre. Tomei banho, almocei. Fiquei indeciso entre ver um filme e colocar os gibis em dia. Comecei a ler Lanterna Verde e o telefone tocou. Pintado! "O problema é a fonte de alimentação que queimou, eu pego aqui na lan house do meu irmão e vai custar X. Tudo bem?". É claro que está tudo bem! "Pode vir buscar daqui a meia hora, então". Inacreditável. Terminei minha revista, comecei a ler Vertigo. Toca o telefone. "Já está pronto, pode buscar quando quiser". Quero dizer, o sujeito não apenas não fica esperando EU ligar, como ainda liga duas vezes.

Volto para a "oficina" de Pintado. O colchonete, a criança e a mulher sumiram. Em um dos monitores em cima da mesa, está rolando Lineage II. Ele liga Indigo na minha frente e funciona. Ele teve a decência de devolver a fonte velha, algo que algumas lojas costumam não fazer. Ele ainda removeu uma ventoinha da máquina que não estava mais funcionando desde a última troca de placa-mãe. "Eu vi que não tinha onde plugar ela na placa e tirei. Sem funcionar, ela só servia para tampar a saída de ar quente". Ele está correto, eu já sabia dessa ventoinha, mas não tinha dado muita atenção. Pintado, o hippie geek tinha visto um problema e tomado a iniciativa de corrigir. Meu queixo estava lá embaixo.

Mais um aperto de mão, um pagamento com gorjeta e voltei com meu instrumento de trabalho para casa.

É certo que nenhum de vocês vai conhecer Gerônimo, vulgo Pintado. Mas fica a dica em relação a lojas burocráticas com seus técnicos mal-remunerados e seus donos frios e arrogantes. Quem tem competência, atende bem. Quem tem competência, resolve.

Ouvindo: REM - Letter Never Sent

3 comentários:

Fagner P. disse...

HAHAHAHAHA Muito boa a história, ótima, fez juz a palavra "crônica". Aí eu digo, essa é a maior vantagem de ser profissional em TI, você nunca mais precisará esquentar a cabeça com técnicos e autorizadas. E ainda as vezes sobra um tempo pra fazer uns serviços extras, pra vizinhos, parentes, etc.

Obs: Ja queimei 3 fontes em menos de 2 anos, e aprendi. Pra mim a fonte é uma peça prioritária, e a causa número 1 de computadores pifados.

Bruno disse...

Vc deu muita sorte, Aquino. Como em toda área, existem muitos péssimos profissionais na área de TI, seja em loja autorizada ou freelancers. Já cansei de ouvir e ver histórias de sobrinho mandando PC com configurações razoáveis p/ loja do tio e receber o PC completamente depenado com hardware avulso só p/ tapar buracos.
Claro, este extremo de trocar todas as peças é raro, mas surrupiar uma fonte legal e colocar uma mais fuleira, tirar sua memórias Corsair e colocar uma kingston falsificada... Isso acontece direto e a grande maioria nem percebe.
Hoje em dia PC é igual carro: ou vc aprende pelo menos o básico do funcionamento ou muito provavelmente será passado p/ trás pelo primeiro técnico que procurar.

Enfim, vire cliente fiel do tal de Pintado e, caso precise procurar outro técnico no futuro, pesquise muito antes de largar seu PC com outra pessoa. A indicação de pelo menos algumas pessoas que vc conhece e sabe que não são completamente leigas vale mais que qualquer selo de aprovação.

Marcos A. S. Almeida disse...

Eheheheh!O Mais legal desta "crônica" foi descobrir a história evolutiva dos seus computadores.Realmente,se você pretende rodar alguns jogos mais recentes precisará fazer um upgrade.Você não especifica qual o modelo de placa de vídeo , mas 160GB de HD já está apertado (pricipalmente se você sucumbe facilmente ás tentações do STEAM...).A fonte que você trocou agora, se não for de potência real, no próximo upgrade precisará troca-la.
Recomendo que no próximo upgrade você faça dois dois orçamentos distintos:um com componentes INTEL + NVIDIA e outro com AMD + ATI. Com certeza o segundo irá ficar muito mais barato e nem por isso pior.
Quanto á "aventura" do consêrto , mal-atendimento é imperdoável e por vêzes já deixei isso claro para alguns lojistas (de forma educada, claro), o prazo de consêrto dado realmente foi muito longo mas a burocracia é necessária dentro de um organização.Têm de ser minimizada e otimizada para satisfação do cliente, mas raramente será totalmente satisfatória para nós clientes, porque sempre desejamos algo pra ontem.E a comparação de um serviço formal com o informal é desleal , por motivos que todos nós sabemos e até por motivos que não são de nosso interêsse.Á grosso modo eu diria que você recorreu á um serviço "pirata" (não querendo fazer juízo da honestidade e da qualidade do serviço do rapaz), sem garantias.Mas atire a primeira pedra quem nunca fez isso?

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Blog criado e mantido por C. Aquino

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