Retina Desgastada
Idéias, opiniões e murmúrios sobre os jogos eletrônicos
Comunidade do SteamMastodonCanal no YouTubeInstagram

7 de setembro de 2009

Raios Catódicos

TV não causa câncer. TV não prejudica a visão. Videogame não estraga a TV. Videogame não emburrece. Eu sei por que eu vivi tudo isso. Em mil novecentos e oitenta e pouco eu passava dez horas por dia de olho na tela da pequena TV a cores de meu quarto jogando jogos eletrônicos compulsivamente. Essa foi a Era do Atari.

O Globo está com uma nostálgica matéria sobre os primórdios desta era no Brasil, aproveitando que alguns títulos estão completando 30 anos este ano e muitos outros irão completar no ano que vem. O artigo se concentra nos fliperamas e no impacto que eles tiveram em várias pessoas daquela época.

Já falei aqui da minha curta mas significativa experiência com os fliperamas, então chegou a hora de falar dos anos mais intensos de minha vida de jogador.

Um Console em Cada Casa

Atari O símbolo máximo desta era se chamava Atari 2600. Ter um destes em casa era o sonho de consumo de qualquer criança que ainda quisesse fazer parte da turma e o destino do décimo-terceiro de muitos pais. Quem tinha bala na agulha chamava os amigos orgulhosamente para exibir o seu console. Aqueles que não contavam com uma renda tão caprichada ou aqueles que tinham um pai que achava que videogame era tudo igual, terminavam com um dos incontáveis "clones" do Atari enfeitando a sala. O meu era um Dynavision, que nem verbete na Wikipédia tem. Mas rodava os jogos da Atari.

Pior destino do que ter um clone do Atari em casa era possuir um Odyssey. Tecnicamente inferior ao 2600, ele se aproveitou da febre emergente dos fliperamas e foi lançado no Brasil antes do produto da Atari. Aqueles que decidiram ser os pioneiros nos jogos eletrônicos domésticos terminaram com um console que todos desprezavam e que não era compatível com a avalanche de títulos que o Atari 2600 trouxe. Curiosamente, o Odyssey lançado no Brasil é o chamado Magnavox Odyssey 2. Como o primeiro Odyssey nunca fora lançado por aqui, visando não confundir a cabeça dos consumidores, decidiu-se trocar o nome.

Outras figuras mais exóticas do recreio tinham um Intellivision. Apesar da marca ter sobrevivido à própria queda da Atari, ninguém respeitava o proprietário de um console que tinha um "teclado de telefone" e um joystick sem alavanca...

Ataris, Dynavisions, Odysseys, Intellivisions. Todo mundo e seu vizinho tinham um console. E jogavam desesperadamente.

Subindo o Rio da Morte

Dois ou três anos de minha infância são um borrão. Um borrão multicolorido de luzes em movimento, sons frenéticos e cheiro de cartucho novo. Corridas na neblina, naves espaciais descendo em zigue-zague, tanques de combustível flutuando no rio, ursos polares com passos fortes e um sapo idiota tentando atravessar a rua. Enquanto adulto, tenho talvez dez vezes mais jogos na minha coleção do que tinha quando criança. Por outro lado, eu jogava vinte vezes mais do que jogo hoje.

River Raid É preciso entender que naquela época os jogos não tinham fim. Não tinham história. Não tinham personagens. Mario, Sonic e Link surgiriam uma geração depois. Mas mesmo sem um final, todo mundo era impelido para frente, para se superar, para alcançar uma marca mais alta do que o seu colega, para ser o melhor, para ser melhor que o próprio jogo. Todo mundo queria ver o que tinha no fim do rio de River Raid, cruzar a linha de chegada de Enduro ou repelir o ataque dos Space Invaders de uma vez por todas. Ainda que alguns destes títulos na verdade tenham um final, um ponto onde a programação não consegue mais resistir e zera o placar, poucos foram os seres humanos que, de fato, alcançaram este mítico Valhalla (e a maioria já estava com barba no rosto quando conseguiu).

Meu favorito era River Raid. Os cenários mudavam quanto mais se avançava e isso fazia toda a diferença. Nenhuma parte do rio era igual a outra. Desde pequeno já estava interessado em mundos abertos e variados... Mas minhas melhores marcas eram em Frostbite. Como se ser ruim no futebol não me classificasse como nerd o suficiente, eu tinha o duvidoso mérito de ser um mestre em um jogo que ninguém conhecia.

O Fim... Ou Apenas um Começo?

Da mesma forma que a febre veio, ela passou. Uma nova geração surgiu e minha família não tinha condições de comprar um Master System ou outro clone qualquer. O vizinho também não tinha. Aquele outro amigo também não. E aquele outro. E, de repente, não havia mais um console em cada casa. Um ou outro afortunado desfrutava de Golden Axe ou Sonic. Os jogos eram diferentes agora, exigiam mais do jogador. Em visitas esporádicas aos amigos privilegiados, não havia tempo para desenvolver os reflexos necessários e a humilhação aos poucos ia se tornando desinteresse. Veio a quarta geração em um intervalo de tempo muito curto e logo ninguém mais estava com cacife para seguir a vertiginosa crescida da indústria.

Nunca mais tive um console.

Mas, assim como antes, a semente do jogador inveterado já estava germinada. Criando raízes.

Anos mais tarde, pulando diversas gerações, o PC surgiu em minha vida. E, em seus primeiros minutos, já havia um jogo instalado nele.

E eu nunca mais parei.

Ouvindo: Evanescence - Understanding (Acoustic Version)

Um comentário:

NevesZerg disse...

Muito bom, muito bom mesmo, sou dessa epoca! revivi como um filme tudo que voce falou.

PS. Vai escrever bem assim la no inferno hein?

Retina Desgastada

Blog criado e mantido por C. Aquino

Outcast - A New Beginning